Monday, January 08, 2007
O carioca banal...
O Rio de Janeiro continua patético. No rastro da decadência tupinicóide - um esquisitíssimo, raro fenômeno, em que uma país consegue entrar em declínio sem nem mesmo ter chegado perto do apogeu! -, esta pobre cidade, com abortada vocação de maravilhosa, tornou-se cenário de filmes de terror classe "b". O carioca está abúlico, indiferente, cínico, no melhor padrão-zumbi-abduzido. Comporta-se à margem de qualquer atitude consciente, como se aquela musiquinha-relâmpago Tô nem aí fosse o verdadeiro hino da metrópole. Nada é com ele, nada o perturba, nada o deixa indignado . Parece que as atribulações do cotidiano o anestesiaram, exatamente como reza a cartilha analítica de Hanna Arendt: banalizou-se o mal, e dane-se todo o mundo...
Já estivemos em países paupérrimos, sem recursos naturais dignos de nota - com graves problemas de saneamento e de higiene, mazelas que também podem ser encontradas em rincões de Banânia - e, no entanto, jamais nos sentimos em perigo, por exemplo, andando à noite pelas ruas. Havia assédio de mendigos de todas as faixas etárias, mas a abordagem não era constrangedora, não continha ameaças veladas, não nos incomodava de forma alguma; pelo contrário, o que nos parecia mais evidente era uma atmosfera carinhosa, alegre, cativante. Essa experiência vital foi a prova concretíssima do que já sabíamos teoricamente: miséria não gera necessariamente crime, pobreza não é a mãe da violência. O diferencial percebido nessas viagens saltou-nos aos olhos pela via cultural, uma vez que as sociedades que visitamos são fortemente reguladas pelas noções, nítidas, de "certo e errado". Mais ainda, essas normas são oriundas de condições religiosas específicas, que garantem a punição ou a recompensa para além das fraquezas humanas, ou seja, há um superego muito sólido por detrás de possíveis falhas da legislação feita pelos homens, garantindo a correta interação social em termos de limites, deveres e obrigações, coisa que Cícero, romano, pagão e orador - não necessariamente nessa ordem... - já promulgava com todas as letras da Lei Natural.
Há alguns anos, a resposta de um de nossos alunos em sala de aula deu bem a medida do abismo cultural que se expande, cada vez mais, entre nossa sociedade-bandalha-bundalelê e as outras, citadas acima. Indagado por que não matava ou roubava, o lindo garotão de classe média disse que "não fazia nada disso porque a polícia... prende!" Bem, deixando de lado a piada relativa à possível "prisão", concluímos, com a concordância da bronca criatura, que, na ausência da repressão imediata, vale tudo! O negócio e ser "ixperto"!
Vida horizontal é isso. No final, nem cova rasa.
Imagem: Hanna Arendt, antes de tomar uma bollystolly.
Marx, o Groucho
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2 comments:
Marx, prende? Nem prende mais!
É a certeza absoluta da impunidade!
By the way, Hanna gostava de bollystolly? Mais um dado para que eu a admire ainda mais :)
Beijos
Querida!
Foi uma das minhas horríveis brincadeiras! Se ela bebia, não sei, mas creio que é grande a probabilidade - muito européia - de ter entornado uns bons goles de vinho tinto...
Beijão!
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