Thursday, February 15, 2007

De volta à semântica: cadê os bois?



Gostamos de falar sobre isto, os bois, os nomes e suas complexas relações.
Já escrevemos recentemente sobre o assunto, do ponto de vista da "opacidade", uma das características do processo de se nomear o "vácuo", ou seja, eliminando-se os bois, sem os quais é inviável haver lucidez onde vigora, a torto e a direito, a imprecisão do antidiscurso, também conhecido, desde os gregos, como texto diabólico.
Pois bem, voltamos ao assunto, mas sob outra perspectiva, sempre na esperança de ampliar a visão do que há de mais importante na produção do caos atual: a ignorância produzida - deliberadamente ou não - pelo assassinato do sentido real das palavras.
Eis uma listinha aleatória do que se produz atualmente em Banânia, como fruto dessa gigantesca falácia que contaminou, sem redenção à vista, a tal fala "coletiva", sob a égide da imprecisão verbal, cujo lema óbvio é quanto mais genérico, melhor:

1 Fala-se em violência. Não se fala em crime! Ok, a generalização oculta os limites de significado entre esses termos, o que é muitíssimo conveniente à manipulação do populacho. É simples: todo crime é um tipo de violência, mas nem toda violência é crime. Usem o raciocínio e perceberão rapidamente as funestas conseqüências dessa armadilha lingüística. No popular, é pôr no mesmo saco, sob o mesmo rótulo, coisas diferentes. Percebam o seguinte: quanto maior a imprecisão semântica - típica das generalizações forçadas - maior o espaço para sofismas e diversionismos - sopa no mel dos clichês.
A outra variante de crime é erro - mas essa é uma invenção petralha...

2 Fala-se em modernidade. O que é isso? Eis aí um conceito realmente impregnado de relativismo em sua estrutura semântica: moderno em relação a quê? Olhem só que interessante: quando surge uma palavra cujo uso implica obrigatoriamente a noção de relativismo, os senhores da pseudo-razão a empregam como valor absoluto! Assim, tudo o que é moderno é automaticamente bom, muitíssimo melhor do que todas as coisas que vieram antes. Isso cria uma situação tipicamente maniqueísta: o moderno é bom, o antigo é ruim. Na base, o mecanismo de sempre: imprecisão dos termos, generalização, reducão drástica do campo das significações. O resultado é a promoção fulminante de uma conveniente pobreza verbal. Obviamente, a percepção da realidade é estrangulada sob a pressão dessa camisa-de-força, mãe perversa do famoso... escotoma!, lembram dele? Quanto mais impreciso o discurso mais cegas são as pessoas que o proferem.

3 Fala-se em igualdade. Mais um conceito tomado como absoluto, no contrapé do seu sentido original: igualdade em que contexto? Pegando carona em Aristóteles, lembramos que, em essência, somos todos realmente iguais. Contudo, o que nos diferencia - os acidentes aristotélicos - nos individualiza, nos dá uma identidade particularíssima de onde saem as respostas à nossa interação existencial. É só olhar em volta e perceber o quanto as pessoas são diferentes, ainda que nascidas, por exemplo, em uma mesma família e expostas a condições de vida semelhantes. A igualdade essencial - somos todos seres humanos - propicia a igualdade perante o estatuto da Lei. Fora desse âmbito, salve-se quem puder, porque cada um responde por si, sob a batuta de sua consciência.

4 Fala-se em educação. Qual delas? A palavra salta na boca dos autômatos como a panacéia de todos os males. Eis aí, mais uma vez, um uso vocabular semanticamente inadequado, pois educação, como mandaria o figurino dos apressados, não resolve nada se não tiver havido, em princípio, a escolha do modelito educacional básico a ser implementado: comunista, nazista, liberal, espartana, maoísta, "tipo assim" Summerhill - hit pedagógico dos anos 60 -, mafiosa, mil frutas, gay, que raios de educação seria? Se for mais, ainda, daquela que anda nos assombrando por aí, recordista de resultados negativos no que se refere a testes de conteúdo objetivo, é melhor fechar todas as escolas.
Na verdade, quando as pessoas clamam por educação para resolver as agruras sociais, elas estão pedindo, inconscientemente, o ensino das normas de conduta moral. Afinal, saber bem matemática e geometria não garante uma baixa criminalidade, certo? Como há uma terrível lavagem cerebral, há décadas, solapando tudo o que se refere a freios comportamentais, incluindo-se aí a eliminação sumária da noção de "culpa" (que horror, que coisa antiga!) via leitura psicanalítica vagabunda, a única saída é a adoção de um simulacro pré-fabricado - forjado ao sabor ideológico dos ocultíssimos podres poderes - , conhecido como a ética fajuta do politicamente correto. Portanto, onde se instalam - e viva o Mec! - "propostas educacionais" tupinicóides, só existe um megaprojeto de lavagem cerebral.
Alguém duvida, a partir dessa análise, que tudo o que está correndo com a conivência das "otoridades" não passa de um plano para forçar o povão a clamar, de joelhos, por uma ditadura??? Afinal, se somos culpados, "enquanto sociedade genérica", por tudo isto que está aí, a saída à vista é tolher a liberdade de todos, não é mesmo? Vale a pena o sacrifício...
As condições já foram criadas. Falta o grand finale.

Uma boa vacina para tudo isso? Uma ótima maneira de identificar esses invasores de mentes, cupins da verdadeira racionalidade? Que tal um cuidadoso estudo da língua, via Filosofia? Todos os mecanismos de defesa estão lá. É só querer ver...

Há mais, muito mais, para relatar aqui, sobre esses convenientes "apagões verbais", fruto de uma deliberada imprecisão semântica que não passa de mais uma tática ultrabatida na esfera da Língua de Pau. Voltaremos ao assunto, em breve.

Marx, o Groucho

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