Thursday, June 03, 2010

Sobre o mito da isenção e outras maracutaias retóricas...



Ano de eleições, mídia assanhada. Os velhos clichês dos botequineiros profissionais - aqueles que se dedicam 24 horas ao discurso de boteco como se estivessem passeando com Aristóteles no baixo Atenas- voltam à baila, destacando-se, sempre, entre eles, a estorinha sobre "isenção". O que seria isso, segundo os hipnotizados de Banânia? Seria não ter  "lado", não ter posicionamento algum, não expressar juízo de valor sobre nada, em suma, comportar-se como uma ameba profissional estrategicamente empoleirada na lâmina do microscópio. Trata-se de uma exigência feita, especialmente, por pessoas que fazem exatamente o contrário, justo porque, no fundo, no fundo, têm... "lado"! Omitem informações, editam o que lhes convém, retiram, do contexto original, frases, palavras  soltas e imagens que, após essa dantesca cirurgia verbal, invariavelmente, assumem o significado oposto, mandando, assim, para as calendas gregas, qualquer possibilidade de um ingênuo buscador da verdade encontrá-la com facilidade. Mas...  - sabe cumé? - um gênio da comunicação assegurou aos bichos-preguiça que "não há fatos, somente versões". De preferência, as deles, é claro...

Um dos patronos desse blog, George Orwell, já tinha a perfeita noção dessa manobra espúria, denunciando-a, há décadas, tanto em A revolução dos bichos quanto em 1984, suas obras mais significativas. Na segunda,  ele cria a novilíngua (newspeak, no original), instrumento do estado totalitário - representado pelo onipresente Big Brother -  visando ao controle mental da população, cuja característica básica era a construção de um vocabulário novo, paralelo à eliminação do antigo, o que era feito por meio de sistemática desconstrução semântica, cujo resultado certeiro era uma extensa lavagem cerebral. Nesse tipo de situação, todo mundo tem um "lado só": não existe oposição, questionamentos, um discurso contraditório que "acorde" as pessoas para a análise do que acontece ao seu redor. Et voilà! Cá estamos de volta à terrinha da "isenção", a senha perfeita para ocultar… a censura! Sob a fachada de um comportamento supostamente ético - como se essa gente doentia estivesse preocupada com a importância disso -,  a turma que ama de paixão a democracia, tanto quanto os passarinhos apreciam os gatos, cala a boca dos que pensam vagamente em contestar o palavrório que pulula (êpa!) na imprensa de todos os matizes. Por que "o palavrório" e não os fatos em si? - perguntaria um filósofo alemão, daqueles bem velhinhos, sempre preocupado com os detalhes irrelevantes. Caro senhor, responderíamos, porque, por mais esquisito que pareça aos distraídos, não existem "fatos" na mídia, somente textos que deveriam narrá-los de forma honesta, numa clave denotativa. 

Tá confuso? Marx, o Groucho, explica: quando a patrulha ideológica grita, exige, cobra "isenção", ela está tentando intimidar os comentaristas que fazem uma leitura mais lógica, mais coerente sobre a narrativa dos acontecimentos que nos chegam aos olhos e ouvidos travestidos de texto jornalístico. Eis aí o ponto fundamental: a autêntica isenção reside no exercício da lógica, que não é exatamente a praia dessa gente regada à prostituição verbal, um cruzamento nada acidental de indolência macunaímica com anos de doutrinação escolar estúpida.  Ai, que preguiça…
Estamos de novo às voltas com a lógica, essa coisa impertinente, cansativa, raramente detectada em dissertações de mestrado e doutorado em Banânia! Sim, impertinente porque é o único instrumento à mão para escarafunchar o bolor das bobagens, desmascarar o visgo das mentiras, desnudar a fantasia delirante dos psicopatas. A mesma lógica que, por exemplo - uma vez que este blog não pratica a "isenção" segundo o estatuto da gafieira midiática, mas a isenção à luz dos ditames do fio de Ariadne -, encontra-se a mil anos-luz da fala alucinógena, misto de papagaio-de-pirata e sonambulismo gagá, da musa daqueles que Orwell, se vivo fosse, arrolaria na classe dos "isentos que seriam mais isentos do que os outros", a imbatível Miss Anacoluto! 

Num capítulo próximo, o fabuloso método de se atirar fora a água da bacia com a criança junto, hehehe...
Imagem: "isentos" fuzilando os do lado de lá...

Marx, o Groucho.


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