Tuesday, June 08, 2010

Olhando e ouvindo, de Heráclito a Narciso...



Tudo tem de ter uma explicação Só os preguiçosos mentais dizem o contrário. O que não sabemos, saberemos um dia, são favas contadas. Se LiaBBB  quer que os outros a vejam, se Dilma já viu, deixou de ver e voltou a ver, se o cara do anúncio das conexões Tigre tenta embromar o cliente com o "veja bem", se o Keiser e seus asseclas não querem ver porque lhes convém, se Tirésias viu o que não devia e não voltou a ver, se Saramago esqueceu-se de incluir a si mesmo no próprio ensaio, enfim, se a turma toda está chafurdando semanticamente na área oftalmológica, é porque algo de estranho se passa no reino da comunicação visual, certo? Erradíssimo! Nossa análise detectou o ponto fulcral de tantos tropeços na vida dos olheiros e…pasmem! a questão é  também AUDITIVA! 
Ninguém parece perceber, mas ver e ouvir são a mesmíssima coisa. VEJAM bem: ver nada mais é do que ouvir com os olhos e vice-versa! Ver imagens e ouvir sons são rigorosamente a mesma tentativa de capturar algo que está logo aí, esperando para nascer.
A imagem fala, o som projeta imagens na mente, tudo não passa de óbvia sinestesia, à espera de Godot... Ah, de repente surgem os perplexos profissionais, tacapes na mão, afirmando que são sentidos diferentes, que "está provado", por isso mais aquilo, que ver é ver e ouvir é ouvir, sem compreenderem que não "viram" o essencial: a simultaneidade desses eventos garante o valor do que foi capturado. Se alguém vê, mas não ouve, não entendeu nada, e o inverso é verdadeiro. 
Ouçam bem, estamos falando de um plano que não se limita ao corpo, aos órgãos que nos situam no universo. Estamos falando de formação de um sentido, de um significado, de um percurso lógico, um encadeamento de elos indispensáveis à compreensão autêntica, não um mero registro de impressões fragmentadas, fenômeno típico da atualidade pós-"muderna", repleta de informações em ritmo acelerado e nenhuma decodificação decente das mensagens implícitas. As pessoas estão-se tornando zumbis bobalhões, cuspindo pedacinhos esparsos de uma totalidade cuja dimensão lhes escapa, em proporção geométrica, cada vez que eles engolem, sem digerir, uma palavra-clichê aqui, uma frase twitada acolá, uma entrevista desconjuntada no telejornal tal, uma saraivada de chavões neuróticos e/ou ideológicos em sala de aula, nos botecos apinhados de risos estúpidos, sob as escadas de um prédio cinzento, nos becos entristecidos, nas ladeiras solitárias, nos aglomerados uivantes, nas platéias hipnotizadas, nas esquinas previsíveis, nos horizontes vorazes…

Em suma, quando alguém implora para ser visto, está, no duro no duro, como diria Holden Caulfield, querendo ser OUVIDO, compreendido, decifrado, identificado, trazido à existência, melhor ainda, ESPELHADO. Tá forte? Mandem um e-mail para narciso@olimpo.gr, aos cuidados de Heráclito, cujo fragmento 34 reproduzimos na saideira:

     Ouvindo, parecem surdos; o ditado lhes diz respeito: presentes, estão ausentes.


(Tradução, diretamente do grego antigo, da musa das "óticas do povo ateniense": "olhando, não viram - porque não olharam! - e deixaram de olhar para não ver o que voltaram a ver, porque eu, particularmente, também não vi!")


Imagem1:o verdadeiro bom velhinho, Heráclito, praticando a visão interior e a torcida pelo Vasco - os olhos bem fechados são para contrariar Stanley Kubrick.
Imagem2: Narciso procurando peixinhos no fundo do lago, enquanto a ninfa Eco, coitada, fica... olhando, completamente abestada...


Marx, o Groucho, juntando os caquinhos dos "fragmentos" para sua tese de pós-pós.




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